SPORE

Spore: O universo em suas mãos

Will Wright conseguiu novamente com um dos mais abrangentes games já criados

Érico Borgo

Em junho passado fomos até a Electronic Arts para testar o criador de criaturas de Spore, o novíssimo projeto de Will Wright, um dos mais famosos designers de jogos eletrônicos da indústria.

Nesses dois meses muita coisa aconteceu com o novo game do criador de The Sims.
O mesmo módulo de criaturas que testamos foi liberado na internet para
testes, com resultados surpreendentes e batendo todas as metas da
produtora Maxis e EA. Basicamente, o que eles imaginavam conseguir em alguns meses de monstrinhos povoando sua Sporepedia
– a central onde todas as criações de usuários poderão ser expostas e
disponibilizadas para outros jogadores – foi alcançado em poucas horas,
superando todas as previsões das empresas.

Obviamente, com isso, a expectativa pelo jogo só aumentou…

Na semana passada pudemos voltar ao escritório da EA. Desta vez
tivemos acesso ao game completo – uma versão ainda inacabada, mas ainda
assim com todas as etapas. Foram duas horas de testes que culminaram em
uma certeza: Will Wright conseguiu outra vez.

O escopo de Spore é simplesmente inconcebível. O jogo começa na Etapa da Poça,
em que o jogador, no controle de um organismo unicelular que vaga por
um caldo primordial oceânico, precisa coletar DNA para melhorar sua
criatura, que pode ser carnívora, herbívora ou onívora.

A fase é um 2-D simples, com perspectiva do alto. Os organismos
começam todos com a mesma cara de girino sem rabo e saem nadando em
busca de alimento. Sua única preocupação no começo é comer coisas
menores que você e evitar os predadores maiores. No entanto, conforme o
DNA se acumula, começam a surgir novas partes para o girinão. Mate um
bichinho que tinha um espeto de defesa e ele será seu. Encontre um
rabicho e você poderá nadar mais rápido. Uma nadadeira permitirá que
você manobre mais depressa, ou um calombo suspeito fará com que veneno
seja disparado de sua retaguarda, entre outros apêndices úteis.

Para usar esses recursos é necessário avançar na escala evolutiva.
Para tanto é hora de dar um gritinho e tentar encontrar uma parceira
pelas imediações (sem dúvida, discutir acasalamento com o pessoal da EA
foi um dos momentos mais surreais da minha carreira). A primeira transa
do girino abriu uma primeira versão simplificada do criador de
criaturas e me fez perceber que em Spore não temos o controle
de um personagem, mas de uma raça. Aquele primeiro organismo já era. O
novo chegou e está mais avançado, mais equipado, mais… evoluído!

A partir daí, é só uma questão de seguir comendo, crescendo (a
perspectiva da tela muda a cada crescimento) e lutando até que – 3
bilhões de anos depois (os mais rápidos que você já viu) – sua espécie
desenvolve um minúsculo cérebro e, com ele, a vontade de ganhar pernas
e ir para terra firme. Chegamos então à etapa dois, a das criaturas.

Todos os pontos de DNA e recursos acumulados na primeira etapa agora
podem ser trocados por novas ferramentas biológicas para que sua raça
enfrente o desafio da vida fora d´agua.

Nesse momento o jogo muda de perspectiva e de tom. Torna-se um game
de ação e exploração em terceira pessoa. Os objetivos também mudam
bastante. Agora não basta caminhar em busca de comida – é preciso
também enfrentar raças hostis e fazer aliados. A socialização é
desenvolvida através de mutações de estilo (um penacho cativante, uma
boca menos agressiva e capaz de cantar, etc) e dá tanto resultado
quanto os ataques. Faça amizades e seus novos aliados o ajudarão a
explorar o mundo. A evolução, claro, também continua e entra nesse
momento o criador de criaturas que já detalhamos bastante aqui.

Aos poucos o ninho cresce, assim como o cérebro da sua raça, e logo ela se torna preparada para a próxima etapa, a tribal.

Na terceira etapa do game a evolução desacelera. Deixa de ser
biológica para tornar-se de tecnologia e social. A raça agora vive em
grupo e o jogo ganha contornos de um RTS
(game de estratégia em tempo real). É necessário criar unidades para
trabalho – a coleta de recursos – ou defesa e desenvolver estruturas
para aperfeiçoamentos contínuos (a criação de aperfeiçoamentos
tecnológicos). O editor de criaturas vira um editor de roupas e
acessórios e a interação (hostil ou pacífica) com as tribos próximas
faz-se necessária para os avanços que culminarão na próxima etapa.

Passam-se os séculos e surge a quarta fase do game, a da Civilização. Com ela, novamente Spore muda de gênero. Depois de plataforma, ação em terceira pessoa e RTS vira um simulador de cidades, uma mistura de Civilization com TheSims simplificada.
O objetivo passa a ser o desenvolvimento urbano da cidade povoada por
sua raça, que agora tem as opções de criar relações comerciais com
outros povos, promover guerras ou exportar seus valores religiosos.
Nessa etapa surgem novos editores: o de edifícios e o de veículos terrestres – ambos tão elaborados quanto o de criaturas. Há também editores mais simples, como o de hinos.
A evolução agora é totalmente cultural e tecnológica – e o objetivo é a
conquista espacial, o desenvolvimento de um motor capaz de colocar uma
nave em órbita para a última – e mais impressionante – etapa.

Na Etapa Espacial o universo é o limite. Depois de passar pelo editor de naves, Spore
fica com todo o jeitão de RPG, com missões espaciais, mundos a serem
explorados e um sem-fim de objetivos possíveis. É aqui que jogo
torna-se realmente impressionante. Com a roda do mouse é possível
afastar a perspectiva… superfície, mundo (que se parecem com os
planetas de Super Mario Galaxy), sistema solar, galáxia,
universo – a espiral que estampa o logo da criação de Wright. Cada
estrela, representada por um pontinho luminoso, é um sistema solar
repleto de opções. Cada um dos milhares de mundos é diferente do outro
e podem conter vida ou não, civilizações ou não, e têm climas
distintos. Novamente, as possibilidades são gigantescas. Que tal
terraformar um planeta e torná-lo viável para a existência da sua
espécie? Ou abduzir criaturas para estudos? São dezenas de ícones na
nave e cada um deles é uma opção de diversão.

Will Wright disse que uma pessoa poderia jogar Spore sua
vida inteira e não ver tudo o que o game oferece. Parece exagero, mas
meu primeiro contato com o jogo realmente deixou-me boquiaberto. Não é
que ele seja um primor de design ou embasbacante pela qualidade
gráfica. Não é essa a intenção do game. Spore é basicamente
uma caixa de ferramentas divina. O universo, de seu nível mais
microscópico ao mais macro e abrangente, é seu para interagir e
transformar.

Por tratar-se de um game "monoteísta", Spore não permite que duas
pessoas joguem juntas. No entanto, para o povoamente aleatório de todos
os mundos de todas as etapas, o game emprega uma das mais geniais
idéias da história dos jogos eletrônicos: a Sporepedia, um
acervo online de criações de usuários ao redor do mundo. Com mais de
três milhões de criaturas (os editores de edifícios, naves e veículos
ainda não estão funcionando), o recurso promove o abastecimento de cada
um dos jogos Spore em operação. Ou seja, suas criações podem
aparecer a qualquer momento no game de qualquer pessoa, garantindo um
suprimento inesgotável e orgânico de novidades.

Todas as etapas começam travadas e assim que jogadas ficam
disponíveis para novas partidas, com outra criatura. E cada partida
certamente será diferente da outra. Parece que Wright criou uma
diversão infinita. Tomara que canse depois de algumas horas de jogo,
algo que só saberemos depois do lançamento, ou Spore significará o colapso da indústria dos games. Com tantas opções, quem vai precisar de outro jogo, afinal?

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