Europa tem um vasto oceano salgado debaixo de uma camada de gelo. [Imagem: NASA/JPL-Caltech/SETI]
Rabiscos promissores
Depois de duas décadas de preparações e adiamentos, duas missões estão prestes a partir para Europa, uma das dezenas de luas de Júpiter que se transformou na maior chance de encontrar vida extraterrestre no Sistema Solar.
O satélite, um dos 67 já identificados ao redor de Júpiter, é menor do que a nossa Lua e, à distância, parece uma bola com riscos que parecem ter sido feitos por uma criança.
De perto, porém, os rabiscos são longas rachaduras no gelo que cobre a superfície de Europa e que se estendem por milhares de quilômetros. Muitas dessas rachaduras estão cheias de uma substância ainda desconhecida, apelidada pelos cientistas de “gosma marrom”.
Exo-oceano
A imensa gravidade de Júpiter gera forças que repetidamente criam um efeito elástico na lua. Mas os estresses criados na superfície de Europa parecem ser melhor explicados pela crosta de gelo flutuando em um oceano.
“Sabemos que há água sob a superfície por causa de medições feitas por missões anteriores. E isso faz de Europa um dos mais excitantes locais potenciais para procurarmos por vida,” afirma Andrew Coates, do Laboratório Mullard de Ciências Espaciais da Universidade College de Londres.
O oceano de Europa tem uma profundidade estimada entre 80 km e 170 km – isso significa que poderia ter um volume de líquido duas vezes maior do que a água de todos os oceanos da Terra.
A água é um pré-requisito vital para a existência de vida como a conhecemos, mas o oceano de Europa pode ter outros pré-requisitos, como uma fonte de energia química para micróbios.
E mais: o oceano pode “se comunicar” com a superfície por uma série de maneiras, incluindo blocos aquecidos de gelo furando a crosta superficial. Assim, o estudo da superfície pode dar pistas do que está acontecendo embaixo, na água.
Imagens da superfície de Europa feitas pela missão Galileu mostram, em sentido horário a partir da superior esquerda: (1) crosta de gelo quebrada na região conhecida como Conamara; (2) placas da crosta que, acredita-se, quebraram e se arranjaram em posições diferentes; (3) faixas avermelhadas; e (4) uma cratera que pode ter o tamanho do Havaí. [Imagem: NASA/JPL/University of Arizona]
Exploração de Europa
É por isso que a NASA está preparando duas missões para explorar Europa.
Uma delas é a Clipper, com lançamento previsto para 2022 e que ficará na órbita da lua. A outra, ainda sem nome, será uma tentativa de pousar.
“Queremos investigar o potencial que Europa tem de abrigar vida. Por isso precisamos tentar entender o que se passa no oceano e na crosta gelada – da composição à geologia, bem como o nível de atividade,” explicou Robert Pappalardo, do Laboratório de Propulsão a Jato da NASA e principal investigador da Clipper.
A sonda espacial levará nove instrumentos, incluindo uma câmera que mapeará a maior parte da superfície da lua. Espectrômetros analisarão a composição química, enquanto um radar de alta potência fará um mapeamento tridimensional da camada gelada. Por fim, um magnetômetro analisará as características mais gerais do oceano.
A sonda Clipper será um verdadeiro acrobata espacial, com órbitas complicadas para fazer vários sobrevoos em Europa. [Imagem: NASA/JPL-Caltech]
Energia para a vida
Se há um fator que torna Europa um caso especial é sua vizinhança: a órbita da lua a leva bem adentro do poderoso campo gravitacional de Júpiter, que captura e acelera partículas criando cinturões de radiação intensa.
Essa radiação pode “fritar” os componentes eletrônicos das espaçonaves, o que limita a duração das missões espaciais. Mas a mesma radiação causa reações químicas na superfície de Europa, resultando em compostos oxidantes.
Na Terra, reações entre oxidantes e compostos redutores fornecem a energia necessária para a vida. Mas em Europa esses oxidantes só são úteis para possíveis micróbios se chegarem ao oceano. Os cientistas acreditam que isso pode acontecer com o processo de convecção da crosta, e que reatores criados pela interação entre a água salgada e o fundo rochoso do oceano podem reagir com os oxidantes.
Pouso em Europa
A planejada segunda missão, projetada para pousar em Europa, poderá usar a tecnologia de “guindaste espacial” (Sky Crane), a mesma que de forma bem-sucedida pôs na superfície de Marte o jipe-robô Curiosity, em 2012. A sonda teria um sistema autônomo de aterrissagem para detectar obstáculos em tempo real.
Sendo assim, a missão Clipper terá a função de também fazer o reconhecimento para um local de pouso da segunda missão. “É como se estivéssemos procurando um oásis, com água próxima à superfície. Talvez a água seja morna e tenha materiais orgânicos”, explica Pappalardo.
A sonda que pousaria em Europa seria ainda equipada com uma serra para coletar amostras de gelo mais profundas e menos atingidas pela radiação. “Queremos buscar as amostras mais preservadas possíveis. Uma forma é cavar fundo, a outra é buscar algum local em que tenha havido algum tipo de erupção, em que material fresco está caindo na superfície”, diz Niebur.
Pousando uma sonda em Europa, será possível determinar se a vida existe ou já existiu na lua de Júpiter. [Imagem: NASA/JPL-Caltech]
Encélado
Mas desde que a missão Galileu descobriu sinais da existência de água em Europa, nos anos 90, sabemos que a lua jupteriana não é um caso isolado.
“Uma das mais significativas descobertas da última década em exploração planetária é que, se você atirar uma pedra nos planetas do Sistema Solar além de Marte, você acabará acertando um mundo com oceanos”, diz Curt Niebur, também membro da missão Clipper.
Em Encélado, uma das luas de Saturno, por exemplo, há um oceano subterrâneo que provoca “erupções” por meio de fissuras no polo sul. O satélite natural, por sinal, poderá ser o destino de uma missão na próxima década.
Niebur, porém, acredita no maior potencial de Europa: “Europa é muito maior que Encélado e tem mais de tudo: atividade geológica, água, espaço, calor e estabilidade em seu ambiente.”
Fonte : Inovação Tecnologica